“Fico parado diante do computador agindo digitalmente. A inação me convém. Sinto-me uma pessoa do meu tempo agindo assim com a ponta dos dedos. Sem sair do mesmo lugar, ajo sem agir”. Marcia Tiburi no livro, Como conversar com um fascista, da Editora Record, página 140. A fluidez do mundo digital (fluidez para lembrar o conceito de mundo líquido do pensador Zygmunt Bauman) trouxe uma aberração nas relações comerciais que me deixa incomodado, o clima de urgência. Tudo é urgente como se um clique fosse o suficiente para resolver qualquer coisa. O obturador da câmera precisa ser trocado depois de certo número de cliques porque a obsolescência programada obriga. Então o fotógrafo do interior do estado, liga de manhã, e diz que está chegando para trocar o “shutter” e precisa ir embora antes do meio dia. Uma varinha mágica digital é ferramenta essencial na mesa do técnico. Na lanchonete ninguém quer esperar mais que alguns minutos para o lanche ser servido. O motor queimado no por
A MUSA, O PLAYBOY E O JUMENTO Hoje eu vou contar uma história de desconfiança, de imaturidade, de ignorância e de quebra: de arrependimento. Vou contar o milagre sem contar os milagreiros. Então vou dizer “musa” e “playboy” no lugar dos nomes. O playboy era o “pegador” do bairro. Foi o primeiro da turma a ter carro, só andava nos trinques e era bonito e bem cuidado. Falava bem, era de uma família de melhor nível cultural e abastada para o padrão daquele bairro miserável. A mãe era professora e o pai funcionário público. Por isso tudo ele era o tal. E era meu “amigo”. A musa era a minha namorada. Linda, olhos claros, ardósia, boca farta de lábios e risos. E era a minha namorada. Não sei bem o quê ela via em mim, pobretão e feio, mas éramos alegres e cheios de planos. Eu a ajudava na escola e ela melhorava a minha autoestima. Era a minha namorada. Um dia o playboy me chamou para um papo reservado: _Bicho, você sabe que eu sou seu amigo, então é minha obrigação te contar
Imitação de Van Gogh Quando você foi embora Refugiei-me dentro de mim E pensei um trigal sem fim Com corvos rondando E caminhos que vão até lugar nenhum. Pensei num céu sombrio e escuro Pensei na minha impotência Diante dos axiomas da sua fé. Quando você foi embora Eu quis pintar com óleo sobre tela Depois quis arrancar minhas orelhas. Quis paralisar meu coração. Mas eu não venho da Holanda Nem nunca estive em Auvers. Então chorei sozinho e pintei dentro de mim O meu campo de trigos com corvos E me descobri morrendo amanhã.
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